Novos fotodiodos inspirados na retina podem impulsionar a visão computacional

Ao longo das últimas décadas, cientistas da computação desenvolveram sensores cada vez mais sofisticados e algoritmos de aprendizado de máquina que permitem aos sistemas computacionais processar e interpretar imagens e vídeos. Essa capacidade impulsionada pela tecnologia, também chamada de visão computacional, tem se mostrado altamente vantajosa para a fabricação e produção de alimentos, bebidas, eletrônicos e diversos outros bens.
A visão computacional pode possibilitar a automação de várias etapas tediosas na indústria e na manufatura, como a detecção de defeitos, a inspeção de eletrônicos, peças automotivas ou outros itens, a verificação de rótulos ou datas de validade e a triagem de produtos em diferentes categorias.
Embora os sensores que sustentam o funcionamento de muitos sistemas de visão computacional já introduzidos sejam altamente sofisticados, eles geralmente não processam informações visuais com tanto detalhe quanto a retina humana (isto é, um tecido sensível à luz no olho que processa sinais visuais).
A maioria dos sensores usados até agora é baseada em quadros (frame-based) ou em eventos (event-based). Sensores baseados em quadros são projetados para capturar imagens em intervalos específicos, enquanto sensores baseados em eventos registram mudanças de brilho em pixels individuais. Vale notar que ambos os tipos de sensores ainda não são tão rápidos e adaptáveis quanto a retina humana.
Pesquisadores da Academia Chinesa de Ciências, do Centro Sino-Dinamarquês de Educação e Pesquisa e de outros institutos desenvolveram recentemente um dispositivo de detecção que espelha a estrutura em camadas da retina. O dispositivo proposto, apresentado em um artigo publicado na revista Nature Nanotechnology, é um fotodiodo (PD), um dispositivo semicondutor capaz de converter luz em corrente elétrica.
“Os sensores atuais de visão computacional, incluindo os tipos baseados em quadros e em eventos, muitas vezes ficam aquém devido à sua dinâmica temporal limitada em comparação com a retina humana, o que prejudica seu desempenho e adaptabilidade gerais”, escreveram Qijie Lin, Congqi Li e seus colegas no artigo.
“Apresentamos um fotodiodo retinomórfico acionado por eventos (RPD) que imita a estrutura em camadas e a via de sinal da retina. O RPD alcança isso ao integrar verticalmente uma heterojunção doadora-aceptora orgânica, um reservatório de íons com morfologia porosa semelhante a uma teia e uma junção Schottky em um único diodo, por meio de fabricação controlada camada por camada e modulação precisa da nanoestrutura.”
O dispositivo inspirado na retina desenvolvido pelos pesquisadores possui três componentes principais: uma heterojunção orgânica doadora-aceptora, um reservatório de íons formado por nanoestruturas porosas e uma junção Schottky.
O primeiro é, essencialmente, uma junção de dois semicondutores orgânicos que facilita a transferência de carga elétrica. O reservatório de íons é uma estrutura esponjosa capaz de armazenar e liberar íons, imitando como os tecidos biológicos utilizam íons para transportar sinais. Por fim, a junção Schottky é uma interface formada entre um semicondutor e um metal que permite a passagem de corrente elétrica em uma direção, mas não na outra.
“Cada componente replica um processo fundamental da retina, e sua interação espontânea resulta em uma dinâmica adaptativa ao ambiente”, escreveram Lin, Li e seus colegas. “Esse design proporciona uma faixa dinâmica superior a 200 dB, reduz substancialmente o ruído e a redundância de dados e permite uma integração em alta densidade. Demonstramos que essas melhorias possibilitam visão computacional de alta qualidade, mesmo em condições extremas de iluminação.”
Nos testes iniciais, o novo RPD desenvolvido por Lin, Li e seus colegas apresentou resultados altamente promissores, superando outros PDs já testados em tarefas de visão computacional. No futuro, o novo dispositivo poderá ser ainda mais aprimorado e aplicado a uma ampla gama de tarefas reais de visão computacional.
“Nosso trabalho demonstra uma abordagem de baixo para cima no desenvolvimento de sensores retinomórficos, impulsionando a criação de sistemas de visão computacional robustos e responsivos, adaptáveis a ambientes de iluminação complexos e dinâmicos”, escreveram os autores.