Fosfina é descoberta na atmosfera de uma anã marrom.

A fosfina tem causado bastante agitação no mundo da astronomia recentemente. Isso se deve, em grande parte, à sua (ainda intensamente debatida) detecção na atmosfera de Vênus. Enquanto a única forma conhecida de produção de fosfina em mundos rochosos, como Vênus, envolve algum tipo de origem biológica, ela é relativamente comum entre os grandes gigantes gasosos e até mesmo em “anãs marrons” — estrelas fracassadas maiores que Júpiter, mas não grandes o suficiente para iniciar o próprio processo de fusão do hidrogênio. Até pouco tempo, ainda não havíamos detectado fosfina na atmosfera de uma anã marrom em outros sistemas solares, mas um novo artigo, elaborado por um grupo diverso de pesquisadores e disponível em pré-publicação no arXiv, usou dados coletados pelo Telescópio Espacial James Webb (JWST) para identificá-la pela primeira vez. Eles também descobriram o mecanismo que dificultava tanto sua detecção — a metalicidade do objeto.
Metalicidade é um conceito muito comum em astronomia, mas que pode parecer contraintuitivo em relação ao uso comum da palavra. Na química, “metais” são elementos químicos definidos com características muito específicas. No entanto, em astronomia, a metalicidade de uma estrela (ou de uma estrela fracassada) é definida pela quantidade de elementos presentes nela que não sejam hidrogênio ou hélio.
Estrelas muito antigas possuem baixa metalicidade, já que o processo de formação de elementos mais pesados que o hélio envolve a explosão de uma geração anterior de estrelas em supernovas. Assim, em geral, quanto mais velha é uma estrela, menor é sua metalicidade. O nosso Sol tem uma metalicidade relativamente alta, mas há estrelas e anãs marrons no “disco espesso” da galáxia que são muito mais antigas e apresentam níveis de metalicidade bem mais baixos.
A equipe de pesquisadores usou o instrumento NIRSpec do Telescópio Espacial James Webb (JWST) para observar uma dessas anãs marrons localizadas no disco espesso da galáxia — Wolf 1130C. Ao analisarem seu perfil espectral, observaram um claro sinal de absorção centrado em torno de 4,3 μm, exatamente onde se espera encontrar a fosfina. Mas por que ela não havia sido detectada antes em outros objetos semelhantes?
Júpiter e Saturno possuem abundante quantidade de fosfina — na verdade, estima-se que o teor de fósforo nesses planetas seja de 5 a 16 vezes maior do que o encontrado em nosso Sol, que já é relativamente rico em metais. Podemos ver o sinal da fosfina com clareza nesses planetas porque um fator de interferência não está presente em suas altas atmosferas: o dióxido de carbono (CO₂). O CO₂ possui linhas de absorção extremamente fortes exatamente no mesmo ponto do espectro onde a fosfina aparece, o que pode facilmente mascarar o sinal mais fraco proveniente desse composto menos abundante.
Em Júpiter e Saturno, a atmosfera superior não é muito quente, portanto a maior parte do carbono presente está ligada ao metano (CH₄) em vez de ao CO₂. O metano possui uma assinatura espectral diferente e, portanto, não interfere na absorção da fosfina como o dióxido de carbono faz.
Entretanto, nas anãs marrons como Wolf 1130C, que se estima ter 44 vezes o tamanho de Júpiter, as atmosferas superiores são muito mais quentes — em parte porque há uma pequena quantidade de fusão nuclear, geralmente de deutério, ocorrendo em seus núcleos. Essa elevação de temperatura permite a formação de dióxido de carbono — pelo menos nas estrelas com alta metalicidade.
O sinal da fosfina foi tão claro em Wolf 1130C porque, devido à sua baixa metalicidade, ela possuía uma quantidade extremamente pequena de dióxido de carbono em comparação com suas semelhantes. Em essência, o problema não é que a fosfina não esteja presente em anãs marrons, mas que seu sinal geralmente é ofuscado por um sinal muito mais forte de um elemento mais comum.
Os pesquisadores foram ainda mais longe e provaram que a fosfina não foi simplesmente transferida para Wolf 1130C a partir de uma das duas estrelas companheiras de seu sistema triplo. Eles confirmaram que o composto foi produzido na própria anã marrom e depois se deslocou para as camadas externas da atmosfera, onde pôde ser detectado. Isso também indica que outras anãs marrons com baixa metalicidade devem apresentar as mesmas assinaturas de fosfina — uma hipótese que pode ser testada em futuras observações.
Isso tem implicações importantes para a busca de fosfina em outros mundos. Embora ninguém afirme que a fosfina encontrada em gigantes gasosos ou anãs marrons tenha qualquer origem biológica — sendo puramente química —, o fato de a linha de absorção desse composto estar tão próxima da de outro composto muito mais comum (CO₂), que não é uma bioassinatura, torna seu uso como indicador biológico muito mais complicado.
O fato de Vênus possuir uma grande quantidade de dióxido de carbono em sua atmosfera também complica ainda mais as descobertas anteriores. À medida que os pesquisadores continuam a buscar novas e melhores bioassinaturas, este estudo sobre a fosfina deve ajudar a moderar as expectativas e incentivá-los a revisitar os dados, garantindo que realmente estejam vendo o que acreditam estar vendo.