Novos implantes terapêuticos cerebrais podem eliminar a necessidade de cirurgia

Adam Zewe | MIT News
E se médicos pudessem colocar minúsculos chips eletrônicos no cérebro, capazes de estimular eletricamente um ponto específico, por meio de uma simples injeção no braço? Isso poderia, no futuro, ajudar a tratar doenças cerebrais graves ou debilitantes, eliminando riscos e custos associados à cirurgia.
Pesquisadores do MIT deram um passo importante para transformar esse cenário em realidade. Eles desenvolveram bioeletrônicos microscópicos e sem fio que podem viajar pelo sistema circulatório do corpo e se autoimplantar de forma autônoma em uma região-alvo do cérebro, onde forneceriam um tratamento direcionado.
Em um estudo com camundongos, os pesquisadores mostram que, após a injeção, esses minúsculos implantes conseguem identificar e chegar a uma região específica do cérebro sem necessidade de orientação humana. Uma vez no local, eles podem ser alimentados sem fio para fornecer estimulação elétrica exatamente na área desejada. Esse tipo de estimulação, conhecido como neuromodulação, tem mostrado potencial no tratamento de tumores cerebrais e doenças como Alzheimer e esclerose múltipla.
Além disso, como os dispositivos eletrônicos são integrados a células biológicas vivas antes da injeção, eles não são atacados pelo sistema imunológico e conseguem atravessar a barreira hematoencefálica sem danificá-la. Isso preserva a função crucial dessa barreira na proteção do cérebro.
Os pesquisadores demonstraram o uso dessa tecnologia — que eles chamam de “circulatrônica” (circulatronics) — para direcionar a inflamação cerebral, um fator importante na progressão de muitas doenças neurológicas. Eles mostram que os implantes podem fornecer neuromodulação localizada em regiões profundas do cérebro, alcançando alta precisão, de poucos micrômetros ao redor da área-alvo.
Além disso, os implantes biocompatíveis não danificam os neurônios ao redor.
Enquanto implantes cerebrais tradicionais normalmente exigem procedimentos cirúrgicos arriscados e podem custar centenas de milhares de dólares, a tecnologia de circulatrônica possui o potencial de tornar os implantes cerebrais terapêuticos acessíveis a todos, eliminando a necessidade de cirurgia, afirma Deblina Sarkar, professora do MIT Media Lab e do MIT Center for Neurobiological Engineering, chefe do laboratório Nano-Cybernetic Biotrek e autora sênior do estudo.
O trabalho também é assinado pelo autor principal Shubham Yadav, estudante de pós-graduação no MIT, além de outros colaboradores do MIT, do Wellesley College e da Universidade de Harvard. A pesquisa foi publicada na revista Nature Biotechnology.
Implantes híbridos
A equipe vem trabalhando na circulatrônica há mais de seis anos. Os dispositivos eletrônicos — cada um com cerca de um bilionésimo do comprimento de um grão de arroz — são compostos por camadas de polímeros semicondutores orgânicos, intercaladas entre camadas metálicas para criar uma heteroestrutura eletrônica.
Eles são fabricados usando processos compatíveis com CMOS nas instalações do MIT.nano e, em seguida, integrados a células vivas para criar híbridos célula-eletrônica. Para isso, os pesquisadores removem os dispositivos da lâmina de silício onde foram produzidos, deixando-os flutuando livremente em uma solução.
“As eletrônicas funcionavam perfeitamente quando estavam presas ao substrato, mas, quando as removemos pela primeira vez, elas deixaram de funcionar. Resolver esse desafio nos levou mais de um ano”, explica Sarkar.
O funcionamento desses dispositivos depende da alta eficiência de conversão de energia sem fio das minúsculas eletrônicas. Isso permite que operem em regiões profundas do cérebro e ainda obtenham energia suficiente para realizar neuromodulação.

Os pesquisadores utilizam uma reação química para unir os dispositivos eletrônicos às células. No novo estudo, eles fundiram a eletrônica a um tipo de célula imunológica chamada monócito, que naturalmente busca áreas de inflamação no corpo. Eles também aplicaram um corante fluorescente para rastrear os dispositivos enquanto cruzavam a barreira hematoencefálica intacta e se autoimplantavam na região cerebral-alvo.
Embora tenham estudado a inflamação cerebral neste trabalho, os pesquisadores esperam usar diferentes tipos de células e até mesmo modificá-las para atingir regiões específicas do cérebro.
“Nosso híbrido célula-eletrônica combina a versatilidade da eletrônica com a capacidade de transporte biológico e a precisão sensorial bioquímica das células vivas”, afirma Sarkar. “As células vivas camuflam a eletrônica, impedindo que ela seja atacada pelo sistema imunológico e permitindo que viaje tranquilamente pela corrente sanguínea. Isso também possibilita que atravesse a barreira hematoencefálica intacta sem precisar abri-la invasivamente.”
Ao longo de aproximadamente quatro anos, a equipe testou vários métodos para atravessar a barreira hematoencefálica de forma autônoma e não invasiva antes de aperfeiçoar essa técnica de integração celular.
Além disso, como os dispositivos de circulatrônica são extremamente pequenos, oferecem precisão muito maior do que eletrodos convencionais. Eles podem se autoimplantar, gerando milhões de pontos microscópicos de estimulação que assumem exatamente o formato da região-alvo.
O tamanho reduzido também permite que os dispositivos biocompatíveis convivam com neurônios sem causar danos. Em uma série de testes de biocompatibilidade, os pesquisadores descobriram que a circulatrônica pode se integrar de forma segura entre os neurônios sem impactar os processos cerebrais relacionados à cognição ou ao movimento.
Após os dispositivos se autoimplantarem na região-alvo, um clínico ou pesquisador utiliza um transmissor externo para emitir ondas eletromagnéticas, na forma de luz infravermelha próxima, que fornecem energia à tecnologia e possibilitam a estimulação elétrica dos neurônios.
Combatendo doenças mortais
O laboratório de Sarkar está atualmente desenvolvendo a tecnologia para tratar diversas doenças, incluindo câncer cerebral, Alzheimer e dor crônica.
O tamanho microscópico e a capacidade de autoimplantação dos dispositivos de circulatrônica podem torná-los especialmente adequados para tratar cânceres cerebrais como o glioblastoma, que produz tumores em múltiplos pontos — alguns deles tão pequenos que não aparecem em exames de imagem.
A tecnologia também pode abrir caminho para tratar cânceres particularmente letais, como o glioma intrínseco difuso da ponte (DIPG), um tumor agressivo no tronco encefálico que geralmente não pode ser removido cirurgicamente.
“Essa é uma tecnologia de plataforma que pode ser empregada para tratar múltiplas doenças cerebrais e transtornos mentais”, diz Sarkar. “Além disso, ela não está limitada ao cérebro — pode ser estendida a outras partes do corpo no futuro.”
Os pesquisadores esperam levar a tecnologia a testes clínicos dentro de três anos, por meio da startup recém-lançada Cahira Technologies.
Eles também estão explorando a integração de circuitos nanoeletrônicos adicionais nos dispositivos, permitindo funcionalidades como detecção, análise de dados integrada e até a criação de neurônios eletrônicos sintéticos.
“Nossos minúsculos dispositivos eletrônicos se integram perfeitamente aos neurônios e coexistem com as células cerebrais, criando uma forma única de simbiose entre cérebro e computador. Trabalhamos com dedicação para empregar essa tecnologia no tratamento de doenças neurológicas em que medicamentos ou terapias padrão falham, para aliviar o sofrimento humano e vislumbrar um futuro em que possamos transcender doenças e limitações biológicas”, afirma Sarkar.
Reproduzido com permissão do MIT News






