Fóssil de trilobita extinto há 450 mil anos transformado em amuleto

Um fragmento de trilobita com sinais de modificação humana, datado entre os séculos I e II d.C., foi identificado nas escavações do sítio arqueológico de A Cibdá de Armea, em Ourense, na Galícia. Trata-se do primeiro trilobita comprovadamente utilizado durante o período romano e apenas o terceiro exemplar do gênero encontrado em contexto arqueológico em todo o mundo.
A descoberta surpreendeu os pesquisadores pela raridade e pelo excelente estado de conservação do fóssil, que apresenta marcas claras de desgaste intencional em sua face inferior. O estudo, publicado na revista Archaeological and Anthropological Sciences, aponta que o objeto provavelmente serviu como adorno pessoal — possivelmente um pingente ou parte de uma pulseira com valor simbólico ou mágico.

A análise paleontológica identificou o trilobita como pertencente ao gênero Colpocoryphe, um artrópode marinho que viveu há cerca de 460 milhões de anos, durante o Ordoviciano. Embora o fóssil tenha sido encontrado em Armea, a rocha em que estava preservado — rica em óxidos de ferro e sem sinais de deformação tectônica — não ocorre na região da Galícia.
Isso permitiu aos cientistas rastrear sua origem provável a mais de 430 quilômetros ao sul, em formações rochosas do centro da Península Ibérica, em províncias como Ciudad Real e Badajoz.
Essa longa distância indica que o trilobita foi deliberadamente transportado até o assentamento romano de Armea, talvez como parte de trocas comerciais ou por iniciativa de alguém que se mudou para a região. A rota mais plausível inclui a antiga Vía de la Plata, uma das principais estradas romanas da Hispânia, que conectava o sul ao norte peninsular.

O exemplar mostra sete superfícies de desgaste artificial, especialmente em sua base, o que sugere que foi esculpido para facilitar seu encaixe em algum tipo de suporte. As marcas são compatíveis com técnicas de polimento por abrasão, e o formato arredondado da peça favorece hipóteses de uso como ornamento. Segundo os autores, o trabalho humano visava preservar a parte superior do fóssil — onde estão os segmentos articulados típicos dos trilobitas —, destacando seu aspecto visual marcante.
A ausência de perfurações não descarta sua aplicação como joia. O estudo propõe que o objeto possa ter sido encaixado em uma moldura de couro ou metal, como ocorre com outros fósseis usados em adereços romanos. Também é possível que tenha sido guardado como talismã, sendo considerado um artefato dotado de propriedades protetoras, em linha com crenças comuns na época.
A presença de fósseis em contextos arqueológicos romanos não é inédita, mas é geralmente limitada a formas como âmbar, dentes ou ossos de grandes animais. Trilobitas — invertebrados extintos há centenas de milhões de anos — são extremamente raros nesses registros, devido à dificuldade de sua exposição natural em ambientes humanamente acessíveis.
Além disso, esse tipo de fóssil era considerado curioso e, por vezes, mágico. Registros históricos indicam que imperadores como Augusto colecionavam ossos fósseis, acreditando tratar-se de restos de gigantes ou monstros mitológicos.