Anne Trafton | MIT News
Nanopartículas revestidas com polímeros e carregadas com medicamentos terapêuticos mostram um grande potencial para o tratamento do câncer, incluindo o câncer de ovário. Essas partículas podem ser direcionadas diretamente aos tumores, onde liberam sua carga terapêutica, evitando muitos dos efeitos colaterais da quimioterapia tradicional.
Na última década, a professora do Instituto MIT Paula Hammond e seus alunos criaram diversas dessas partículas utilizando uma técnica conhecida como montagem camada por camada. Eles demonstraram que as partículas podem combater o câncer de forma eficaz em estudos com camundongos.
Para aproximar essas nanopartículas do uso em humanos, os pesquisadores desenvolveram agora uma técnica de fabricação que permite gerar quantidades maiores das partículas em uma fração do tempo.
“Há um grande potencial nos sistemas de nanopartículas que temos desenvolvido, e ficamos muito animados, mais recentemente, com os resultados positivos que temos observado em modelos animais, especialmente nos tratamentos para o câncer de ovário”, diz Hammond, que também é vice-reitora de corpo docente do MIT e integrante do Instituto Koch para Pesquisas Integradas sobre o Câncer. “Em última instância, precisamos levar isso a uma escala em que uma empresa consiga fabricar essas partículas em larga escala.”
Hammond e Darrell Irvine, professor de Imunologia e Microbiologia no Instituto de Pesquisa Scripps, são os autores seniores do novo estudo, publicado na revista Advanced Functional Materials. Ivan Pires, atualmente pós-doutorando no Hospital Brigham and Women’s e pesquisador visitante no Instituto Koch, e Ezra Gordon são os autores principais do artigo. Heikyung Suh, técnica de pesquisa do MIT, também é autora do estudo.
Um processo simplificado
Há mais de uma década, o laboratório de Hammond desenvolveu uma técnica inovadora para construir nanopartículas com arquiteturas altamente controladas. Essa abordagem permite que camadas com diferentes propriedades sejam depositadas na superfície de uma nanopartícula ao expô-la alternadamente a polímeros carregados positivamente e negativamente.
Cada camada pode ser incorporada com moléculas de medicamentos ou outros agentes terapêuticos. As camadas também podem carregar moléculas de direcionamento que ajudam as partículas a localizar e penetrar nas células cancerígenas.
Usando a estratégia originalmente desenvolvida pelo laboratório de Hammond, uma camada é aplicada por vez, e após cada aplicação, as partículas passam por uma etapa de centrifugação para remover qualquer excesso de polímero. Segundo os pesquisadores, esse processo é demorado e difícil de escalar para produção em larga escala.
Mais recentemente, um estudante de pós-graduação do laboratório de Hammond desenvolveu uma abordagem alternativa para purificar as partículas, conhecida como filtração por fluxo tangencial. No entanto, embora tenha tornado o processo mais eficiente, ainda era limitado pela complexidade da fabricação e pela escala máxima de produção.
“Embora o uso da filtração por fluxo tangencial seja útil, ainda é um processo de pequeno porte, e uma investigação clínica exige que tenhamos muitas doses disponíveis para um número significativo de pacientes”, afirma Hammond.

Para criar um método de fabricação em escala maior, os pesquisadores utilizaram um dispositivo de mistura microfluídico que permite adicionar sequencialmente novas camadas de polímero à medida que as partículas fluem por um microcanal dentro do dispositivo. Para cada camada, os pesquisadores conseguem calcular exatamente a quantidade necessária de polímero, o que elimina a necessidade de purificar as partículas após cada adição.
“Isso é realmente importante porque as etapas de separação são as mais caras e demoradas nesses tipos de sistemas”, afirma Hammond.
Essa estratégia elimina a necessidade de mistura manual dos polímeros, agiliza a produção e integra processos compatíveis com as boas práticas de fabricação (GMP). As exigências de GMP da FDA garantem que os produtos atendam aos padrões de segurança e possam ser fabricados de forma consistente — o que seria altamente desafiador e caro com o processo anterior em etapas por lotes. O dispositivo microfluídico usado neste estudo já é empregado na fabricação GMP de outros tipos de nanopartículas, incluindo vacinas de mRNA.
“Com a nova abordagem, há muito menos chance de erros do operador ou imprevistos”, diz Pires. “Esse é um processo que pode ser prontamente implementado dentro das normas GMP, e esse é realmente o ponto-chave aqui. Podemos criar uma inovação dentro das nanopartículas camada por camada e produzi-la rapidamente de uma forma que permita avançar para ensaios clínicos.”
Produção em escala ampliada
Usando essa abordagem, os pesquisadores conseguem gerar 15 miligramas de nanopartículas (o suficiente para cerca de 50 doses) em apenas alguns minutos, enquanto a técnica original levaria quase uma hora para produzir a mesma quantidade. Isso pode viabilizar a produção de partículas em quantidade mais do que suficiente para testes clínicos e uso em pacientes, segundo os pesquisadores.
“Para aumentar a escala com esse sistema, basta continuar operando o chip, e é muito mais fácil produzir mais do seu material”, explica Pires.
Para demonstrar sua nova técnica de produção, os pesquisadores criaram nanopartículas revestidas com uma citocina chamada interleucina-12 (IL-12). O laboratório de Hammond já havia demonstrado anteriormente que a IL-12, quando administrada por meio de nanopartículas camada por camada, pode ativar células imunológicas essenciais e retardar o crescimento de tumores ovarianos em camundongos.
Neste estudo, os pesquisadores descobriram que as partículas carregadas com IL-12, fabricadas com a nova técnica, apresentaram desempenho semelhante ao das nanopartículas originais feitas camada por camada. Além disso, essas nanopartículas não apenas se ligam ao tecido cancerígeno, como também demonstram uma característica única: elas não penetram nas células cancerosas. Isso permite que funcionem como marcadores sobre as células tumorais, ativando o sistema imunológico localmente no tumor. Em modelos murinos de câncer de ovário, esse tratamento pode levar tanto à desaceleração do crescimento tumoral quanto à cura.
Os pesquisadores registraram um pedido de patente para a tecnologia e agora estão trabalhando com o Deshpande Center for Technological Innovation, do MIT, com a expectativa de, possivelmente, formar uma empresa para comercializar a inovação. Embora o foco inicial esteja em cânceres da cavidade abdominal, como o câncer de ovário, os pesquisadores afirmam que o trabalho também pode ser aplicado a outros tipos de câncer, incluindo o glioblastoma.
A pesquisa foi financiada pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH), pelo Marble Center for Nanomedicine, pelo Deshpande Center for Technological Innovation e pelo Koch Institute Support (core) Grant do Instituto Nacional do Câncer (NCI).
Reproduzido com permissão do MIT News.